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sábado, 4 de fevereiro de 2012

O Ovo da Serpente no Seder de Pessach?

Por Sha'ul Bentsion - www.torahviva.org


 
Nossa história começa na Mesopotâmia, na antiga região de Bavel (Babilônia). Esse é o berço de uma deusa conhecida como a “Rainha dos Céus”. Ishtar era a deusa da fertilidade. Ishtar foi conhecida por diversos nomes, tais como Innana, Oestre, Asherah, e tendo inspirado outras deusas da mitologia de outros povos tais como Afrodite e Isis. A quantidade de culturas que a veneravam atesta para sua grande popularidade. O culto a Ishtar teve sua origem na região da Babilônia nos tempos primitivos, tendo sido adorada através de diversos templos e santuários nas regiões em torno do Tigre e do Eufrates. A popularidade de Ishtar se explica pelo fato de ser considerada a deusa da fertilidade, o que em sociedades agrárias representava muito.

A Mitologia de Ishtar

Na mitologia Babilônia, Ishtar teve muitos amantes, mas um em particular era pranteado por seu destino trágico: Tamuz (também conhecido como Dumuzi), o deus da colheita. Segundo os relatos encontrados nas tábuas sumérias e acadianas, tais como o texto “O Cortejo de Innana e Dumuzi”, Ishtar teria descido ao mundo dos mortos para tentar usurpar o trono de sua irmã- gêmea.
Para adentrar o local, precisou passar por 7 portões, deixando uma peça de roupa em cada. Ao chegar à sala do trono, estava completamente nua. Mesmo assim, assentou-se no trono. Sua arrogância teria despertado a ira dos demais deuses babilônios, que a teriam matado. Ishtar teria enviado Tamuz juntamente com seus próprios demônios para pedir ajuda a alguns deuses.
Porém, para ser livrada da morte, apontou Tamuz para morrer em seu lugar.
Desde que teria roubado as chamadas tábuas do destino, Ishtar tornou-se conhecida como a “Rainha dos Céus”. Desse título deriva o nome Innana, que J. Gelb em sua obra “The Name of the Goddess Innin” aponta como sendo derivado de “Nin Anna”, que significaria em acadiano “senhora do céu”.
Ishtar/Innana era também a filha de Sin, antigo deus-lua da região da mesopotâmia. Seu nascimento estaria associado à lua cheia, que igualmente simbolizava a fertilidade. Afinal, a lua cheia representava o momento da abundância lunar, e a lua tinha papel importante na agricultura. Por ser a deusa da fertilidade, era portanto celebrada especialmente na primeira lua cheia da primavera.

A Deusa-Meretriz
O culto a Ishtar continha em seu cerne atos de prostituição ritual. Pois, a partir da sua posição enquanto deusa da fertilidade, Ishtar também governava sobre o sexo, isto é, sobre a fertilidade humana. Ishtar/Innana, era portanto conhecida como “a meretriz”, embora o termo não fosse considerado pejorativo entre seus seguidores. Ao lado, a figura de um vaso de cerca de 4 mil anos, exposto no Louvre, ilustra o aspecto de meretriz através da grande ênfase no triângulo genital da imagem.
Um dos hinos a Ishtar/Innana, recuperados entre os manuscritos sumérios, o “Hino a Innana como Ninegala”, diz o seguinte:

“Quando os servos soltam os rebanhos, e quando o gado e as ovelhas retornam ao curral e ao aprisco, então, minha senhora, como os pobres sem nome, tu vestes uma única vestimenta. As pérolas de uma meretriz são colocadas em volta de teu pescoço, e é provável que captures um homem da taverna”.




O Ovo e o Nascimento de Ishtar

Um dos principais símbolos da adoração à deusa Ishtar está no uso litúrgico do ovo. O ovo era considerado na religião babilônia como sendo um símbolo de fertilidade.
A história mitológica do nascimento de Ishtar é o que a une ao uso litúrgico do ovo pode ainda ser encontrada na mitologia síria, na qual Ishtar era conhecida como Ashtarte. Um texto romano de cerca do século 2 ou 3 DC, erroneamente atribuído ao historiador Higino, narra o tema da seguinte forma:
“No rio Eufrates, um ovo de maravilhoso tamanho é dito ter caído, o qual foi rolado para a margem pelos peixes. Pombas se assentaram sobre ele e, quando se aqueceu, chocou Ashtarte, que foi posteriormente chamada de 'A Deusa Síria'. Uma vez que ela excedeu em justiça e retidão, por razão de um favor concedido por Zeus, os peixes foram contados com as estrelas, e por causa disso os sírios não comem peixe ou pombas, considerando que são deuses”.
A partir dessa história mitológica, o ovo tornou- se um dos símbolos da deusa Ishtar, passando a ser usado de forma litúrgica em sua adoração. Além de fazerm parte de refeições litúrgicas, os ovos eram decorados com motivos religiosos e arte abstrata, sendo usados como enfeites decorativos. Até hoje, a Pérsia e o Irã retêm o costume de pintar ovos como comemoração ao “Norouz”, que é o ano novo do Zoroastrismo. Ao lado, um exemplo dessa tradição:
Onde quer que houvesse influência do culto a Ishtar, o ovo estava presente como parte da comemoração de festas da primavera. O ovo sobre as águas também passou a figurar como uma alegoria mitológica à própria criação do mundo. Ao lado, um exemplo na cultura egípcia do “ovo mundano”. O ovo é reverenciado sobre a Ankh, símbolo que representa a união entre Isis e Osíris.
Abaixo, duas imagens clássicas, do livro “Mythology” vol. 3 de Bryant, mostram à esquerda o Ovo de Heliópolis, a cidade egípcia do deus-sol. Esse ovo tem sobre si a figura do crescente visível, associado à adoração do deus-lua Sin, pai de Ishtar/Innana. À direita, o Ovo de Tifon, da mitologia grega – que ilustra sua associação com Afrodite, a contraparte grega de Ishtar. 


Israel e Ishtar nos Tempos Antigos
Considerando que o culto à deusa Ishtar é bastante primitivo e difundido, a relação entre Israel e Ishtar começou bastante cedo. Sobre isso, a Enciclopédia Judaica afirma:
“Astarte é o nome fenício de uma deusa-mãe semita primitiva, da qual as mais importantes divindades semitas se desenvolveram. Ela era conhecida na Arábia como “Athtar”, e na Babilônia como “Ishtar”. Seu nome aparece no Antigo Testamento (Melachim Alef/1 Reis 11:5; Melachim Beit/2 Reis 23:13) como “Ashtoret”, uma distorção de “Ashtart”, feita a partir da analogia de “Boshet” (compare com Jastrow, em “Jour. Bibl. Lit.” 13:28, nota). Shlomo (Salomão) teria erguido um lugar alto para ela próximo a Yerushalayim (Jerusalém), o qual teria sido removido durante a reforma de Yoshiyahu/Josias (Melachim Alef/1 Reis 11:5,33; Melachim Beit/2 Reis 23:12). Astarte é chamada nessas passagens de “a abominação dos sidônios” porque, como as inscrições de Tabnith e Eshmunazer mostram, ela era a principal divindade daquela cidade (vide Hoffmann, “Phönizische Inschriften,” 57, e “C. I. S.” No. 3). Em países fenícios, ela era a contraparte feminina de Ba'al, e certamente foi adorada com ele pelos hebreus, os quais em alguns momentos se tornaram seus devotos. Isto é provado pelo fato de que Ba'alim e Ashtarot são usados diversas vezes (Shoftim/Juízes 10:6; Sh'muel Alef/1 Samuel 7:4 e 12:10)..”.
De fato, isso aparece bem cedo nas Escrituras:
“Tornaram os filhos de Israel a fazer o que era mau perante YHWH e serviram aos ba’alim, e a Ashtoret, e aos deuses da Síria, e aos de Sidom, de Moabe, dos filhos de Amom e dos filisteus; deixaram YHWH e não o serviram.” (Shoftim/Juízes 10:6)
Podemos perceber, portanto, desde cedo que os israelitas começaram a seguir a Ishtar, e que isso foi considerado abominação por Elohim. Até mesmo Shlomo (Salomão) caiu em tal pecado:
“Shlomo seguiu a Ashtoret, deusa dos sidônios, e a Milcom, abominação dos amonitas.” (Melachim Alef/1 Reis 11:5)
Todavia, após a reforma realizada por Yoshiyahu (Josias), conforme a própria Enciclopédia Judaica afirma, o povo voltou para as práticas bíblicas, para a fé em Elohim, e deixou a abominação de lado, pelo menos temporariamente:
“O rei profanou também os altos que estavam defronte de Yerushalayim, à mão direita do monte da Destruição, os quais edificara Shlomo, rei de Israel, para Ashtoret, abominação dos sidônios, e para Quemos, abominação dos moabitas, e para Milcom, abominação dos filhos de Amom.” (Melachim Beit/2 Reis 23:12)
 Porém, o povo de Yehudá (Judá) voltaria a adorar Ishtar após o seu retorno do exílio de Bavel (Babilônia). Essa adoração foi novamente denunciada, dessa vez pelos nevi’im (profetas), conforme a Enciclopédia Judaica afirma:
“Yirmiyahu/Jeremias (7:18; 44:17,18) e Yehezkel/Ezequiel (8:14) atestam para várias formas dessa adoração [a Ishtar] em seu tempo, a qual pode se referir a uma importação direta da Babilônia. O uso sacrificial de sangue de porco (Isa. 65:4 e 66:3) podem ser uma referência a esse tipo de culto similar ao que é conhecido no Chipre, onde porcos eram sacrificados a Astarte (“Jour. Bibl. Lit.” 10:74 e “Hebraica,” 10:45,47)”
De fato, Yirmiyahu (Jeremias) denuncia a prática, ao afirmar:
“Acaso, não vês tu o que andam fazendo nas cidades de Yehudá e nas ruas de Yerushalayim? Os filhos apanham a lenha, os pais acendem o fogo, e as mulheres amassam a farinha, para se fazerem bolos à Rainha dos Céus; e oferecem libações a outros deuses, para me provocarem à ira.” (Yirmiyahu/Jeremias 7:18)
Yehezkel cita ainda a prática de adoração ao consorte de Ishtar, Tamuz:
“Levou-me à entrada da porta da Casa de YHWH, que está no lado norte, e eis que estavam ali mulheres assentadas chorando a Tamuz.” (Yehezkel/Ezequiel 8:14)


O Retorno às Práticas Babilônias
Algum tempo depois do exílio, algumas seitas judaicas, por razões de perseguição religiosa e tentativa de domínio sobre a vida eclesiástica do povo de Israel, passaram a seguir o calendário babilônio que, à época, fora popularizado pelos siro- fenícios como um calendário internacional.
Á época, eram muito raros os calendários inteiramente civis, o que significava que os calendários estavam profundamente associados às práticas religiosas. E o calendário babilônio não era diferente. Assim como costumes associados ao ano-novo babilônio, conhecido como festival do de Akitu, foram incorporados pelo Judaísmo, o mesmo ocorreu com alguns costumes da festa da fertilidade de Ishtar. Um deles, pode- se dizer, a celebração do Pessach associada à lua cheia.
Para maiores informações sobre a controvérsia calêndrica em Israel, bem como sobre a adoção do calendário babilônio por parte de alguns segmentos do Judaísmo, vide nossa série de estudos sobre o calendário.



Ishtar à mesa de Elohim
Outra influência que pode ser observada no Judaísmo Ortodoxo é a presença do ovo de Ishtar no Seder (“jantar”, na realidade “serviço” ou “ordem”) de Pessach!  A figura abaixo mostra um tradicional prato de Pesach (a “Páscoa” judaica) contendo os elementos que são usados no ritual litúrgico:
Podemos observar os seguintes elementos:
Ervas amargas, conforme indicado em Shemot (Êxodo) 12:8
Vegetais, simbolizando as primícias da época da primavera, que remontam a Vayicrá (Levítico) 23:10
O osso chamuscado do cordeiro – embora para muitos seguidores de Yeshua esse rito não seja realizado, podemos ainda dizer que tem relação com o Corban Pessach (sacrifício de Pessach), que era um cordeiro.
O ovo da deusa Ishtar! Será coincidência a presença de um ovo, que não tem absolutamente nada a ver com a narrativa bíblica da saída de Mitsrayim (Egito) mas que tem tudo a ver com a festa da fertilidade de primavera da deusa Ishtar, estar presente numa festa cuja época se encaixa com tal festa pagã?
 As explicações para a presença desse verdadeiro ovo de serpente no seder judaico são as mais variadas. Explicações extraoficiais tais como “a sorte gira” ou “o ovo simboliza a vida” (faltou ressaltar que simboliza a vida em culturas pagãs), são dadas das formas mais variadas e inusitadas.
Mas fato é que esse embaraço permanece contaminando as mesas judaicas até os dias de hoje, e ninguém sabe explicar como lá apareceu.
A explicação “oficial” do Judaísmo é dada por Shaina B. Lipskier, que afirma o seguinte:
“Os dois simbolismos do ovo não devem ser confundidos: Ele é 'exibido' no prato do Seder para comemorar a oferta de chaguigá [oferta festiva]. Ele é “comido” antes da refeição como sinal de pranto”.
Ora, a oferta a que Shaina B. Lipskier se refere seria supostamente uma oferta “adicional” oferecida juntamente com o Corban Pessach (sacrifício de Pessach), que era comida como “entrada” para o corban pessach. Só existe um pequeno detalhe: A Torá jamais menciona tal oferta.
E, ainda assim, seria estranho imaginar que um ovo (mesmo cozido ou assado) faria alusão a uma oferta queimada. E mais estranho ainda que o ovo simbolizasse o luto.
Na realidade, a oferta adicional existe, e o luto também. A oferta é feita à deusa Ishtar, e o luto é todo de Elohim, que mais uma vez vê o seu povo absorver costumes de Bavel (Babilônia), contrariando a Sua Torá, que afirma:
“E não andeis nos costumes das nações que eu expulso de diante de vós, porque fizeram todas estas coisas; portanto fui enfadado deles.” (Vayicrá/Levítico 20:23)
Yeshua advertiu os líderes do povo ao dizer:
“Mas em vão me adoram, ensinando doutrinas que são preceitos de homem.” (Matitiyahu/Mateus 15:9)


Conclusão
Devemos tomar muito cuidado com a idolatria a tudo o que é judaico. Nem tudo o que reluz é ouro, como diz o ditado popular. Elohim nos chamou e nos determinou especificamente que deixássemos o sistema religioso de Bavel (Babilônia). Todavia, existe ainda muito pouco cuidado por parte dos israelitas no que diz respeito à pesquisa das origens do que está por detrás das práticas do Judaísmo Rabínico.
Muitas práticas pagãs, babilônias e de outras religiões, foram incorporadas ao longo dos séculos, e é preciso analisá-las à luz da Bíblia.  Ao participar do Pessach, não o façamos de forma leviana, mas sim entendendo que temos a responsabilidade de nos atermos à pureza da fé bíblica. Assim como Sha’ul (Paulo) nos afirma que Belial não tem parte com a Casa de Elohim, da mesma forma o ovo da serpente, um dos ícones da deusa-meretriz, não deve ter parte da mesa de Elohim.

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